domingo, 5 de setembro de 2010

O ateu e o inalcançável Mistério

Por Ricardo Kelmer


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O ideal seria que todo religioso percebesse que sua verdade é apenas uma versão do inalcançável Mistério.

Considero-me um ateu místico – porque me relaciono com a vida de uma forma meio mística mas sem a crença em deuses. Se há uma crença que sigo é o amor pela Terra e pela Humanidade. A Terra é minha Mãe Sagrada, meu país sem fronteiras, e toda a Humanidade, em sua bela diversidade, é a minha família. Não pertenço a nenhum rebanho de Deus, não sou de nenhum povo escolhido – faço parte do Povo da Terra.

Cresci no catolicismo e se, após a adolescência, consegui escapar de sua prisão cultural, por outro lado meu fascínio pelo Sagrado e pelo Mistério aumentou. Inspiram-me e me emocionam as mitologias das religiões mas entendo seus deuses como meras projeções humanas, criações culturais a respeito do imenso e insondável mistério da vida, e assim sendo, vejo a religião como uma questão de foro íntimo, algo inteiramente pessoal.

O religioso, porém, tende a entender sua visão particular do Mistério como verdade única e inquestionável e quem pensa diferente está errado. O fanático vai um passo além: ele se sente no dever de pregar, converter e salvar os diferentes do Mal. E o fanático radical é capaz de agredir, destruir e matar em nome de seu deus. O ideal seria que todo religioso percebesse que sua verdade é apenas uma versão do inalcançável Mistério, mais ou menos como um acontecimento que tem inúmeras testemunhas mas que, ainda assim, nunca é esclarecido inteiramente.

Sinto que o fanatismo religioso, com seu ódio ao diferente, nos trará cada vez mais problemas. Em tempos de crise financeira, problemas sociais, violência, guerras e desequilíbrio ecológico, o apelo religioso se intensifica e é aí que o fanatismo prolifera, com seu discurso salvacionista. O que pode ser mais perigoso que alguém que tem a mais absoluta certeza que age em nome do ser supremo do Universo, que lhe deu ordens de nos salvar? Putz, ninguém merece.

São poucos os que se arriscam a questionar os posicionamentos religiosos, mesmo quando eles são claramente perigosos. A crítica à religião chega ao religioso como terrível blasfêmia e não como um legítimo e sadio ato de discordância entre dois pontos de vista. Apesar disso, as pessoas livres não devem se omitir e, quando for o caso, precisam apontar e criticar os abusos religiosos, assim como todo tipo de abuso, sem medo de irem queimar no Inferno. Até porque lá deve ter uns inferninhos ótimos.
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Ricardo Kelmer 2008 – blogdokelmer.wordpress.com

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